Estranho,
nem faz tanto tempo, só uns meses. Apenas alguns meses desde a última vez em que
o pé de amora do colégio estivera carregado de meninas sedentas pelo doce
colorido das frutas pequeninas.
Gritavam de felicidade e excitação apoiando-se
umas nas outras, sacudindo de forma desastrada os galhos da árvore, como se
aquilo fosse o maior feito de suas vidas. As mais medrosas e pesarosas não se
arriscavam, assistiam tudo em terra firme, encorajando as catadoras de amora
com pequenos pulinhos e tapinhas em seus tornozelos.
Era um sistema. Caçavam as melhores e carnudas. Queriam as do topo, roxas avermelhadas,
maduras. E ficavam apenas na vontade, contentando-se apenas com as pequeninas e
azedas.
A alegria matutina durava até a inspetora aparecer no topo da escada principal,
com o seu olhar carrancudo apitando para as
garotas descerem dali. Responsabilidade do colégio. “Parecem moleques”, gritava.
Era tudo diversão, ainda assim. Triste pensar que era rotina, tudo isso. Os risos, os cafés, as idas até o pátio central para largatixar.
Era constante. Nós éramos criaturas sinceras. As horas exercem nos acomodados uma espécie de inércia desavisada. É triste.
É abril, mas ainda cantamos as músicas de novembro. E toda vez que passo pelo
pé de amora solitário e nu, apoiado ao muro amarelado do colégio, suspiro.
Suspiro abrindo as portas dos pulmões. É que se aquele muro falasse, ele falaria
de saudade. Ele faria uma síntese dos esbarrões que a vida nos dá e do quanto cada uma das catadoras de amora mudou naquele novembro quente. Um dia a
gente se esbarra. Ainda não é época de fruta no pé.
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