terça-feira, 14 de agosto de 2012

Hoje foi muito parecido com ontem


Hoje foi muito parecido com ontem. Talvez, hoje, seja bem parecido com terça passada, também. Comprei pão, passei pela esquina. Vendia-se uma casa. Um cachorro latia e um carro buzinou para a rua vazia.

Hoje lembrou quarta e quinta. E de tão parecido com ontem, me dei conta de que tinha companhia em quase todas as noites da semana passada. Hoje foi um dia muito parecido com amanhã, certamente.

Hoje tive muitas saudades suas, não soube conduzir o pensamento e acabei lembrando de você novamente. E do teu peito, repouso do meu sono
. Pensei em você e em tudo que ainda tenho pra perder e o outro tanto que vem por aí. Hoje falei demais. Mas não adianta, se engana brutalmente quem pensa que existe correlação entre amor e maturidade, meu bem. A gente segue a lógica do arrependimento pra não tropeçar e não morrer de orgulho.
A fuga se afogou num copo de chá de pêssego com gosto de boldo.

Hoje talvez tenha mesmo sido terça passada, com sorte será sexta ou sábado. No fim tudo se adapta e se arrasta novamente ao habitual.

E como eu era sem você? Não lembro, não lembro mesmo, prefiro pensar se hoje é terça, que pra almoçar tinha feijão, que amanhã será quarta e choverá a tarde toda, e depois virá quinta, e se eu puder, chegarei até sexta.
Hoje foi engraçado ver o quanto arrepia a brisa e que a gente vai ficando velho e aprendendo a esperar cada vez menos, e constatando que ainda assim, todo mundo sente medo.

Hoje foi mesmo semana passada. A minha postura é errada, a cadeira balança e me engole sem ter opção. Acho que é domingo dentro de mim.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A primeira vez em que ouvi falar dos teus olhos.


Da primeira vez em que ouvi falar dos teus olhos, te achei meio esquisita.
Maria disse que tu era perturbada, meio petulante e que tinha olhos que faziam qualquer menino no auge da minha idade se perder e ficar feito idiota. E eu, moleque, curioso, criado aos pontapés divinos, de rosto pintado de asfalto, a ouvia e guardava cada detalhe dos olhos que não deveriam ser mirados de jeito algum.

Fui cuidadoso. Passava pela tua casa como o diabo foge da cruz e evitava cruzar o teu caminho – e se o fazia, a reza era grande e os olhos sempre mirados no chão.


A verdade é que no final das contas, numa tarde dessas aí, tu perguntou as horas pra mim, daí te olhei nos olhos e, frágil como uma cristaleira, ruí. Porque ali já era amor. E os teus olhos, no final das contas, deveriam ser admirados pelo menos seis ou sete vezes ao dia.
Às vezes a gente se pergunta – e sempre que a gente se pergunta nunca vai saber a resposta. E teus olhos dizem demais. Não ligo se a resposta for silenciosa.

Pelos teus olhos arrasto um bonde se precisar. Pelas esquinas, não se fala de outra coisa. Me chamam de esperança, me gritam “corajoso!”.
Porque a ansiedade aumenta sempre que imagino você admirando as samambaias nas varandas azulejadas, achando graça nas trepadeiras escalando as paredes do bairro. E que falem. Desde que Garibaldi amou Anita, tudo é novo, tudo é sublime.