sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Sete palmos de terra


Você tinha vida demais, Helena. Chegava até a me confundir com tal nível de entusiasmo. Era difícil de te acompanhar. E a saudade, essa saudade que me acompanha, me presenteia com cada traço teu no retrato. Traços estes que migraram  para o contrário dos nossos planos.
A gente só repara que o tempo passa entre um recordar e outro, olhando pela janela do carro. E com você foi assim. Notávamos, dia após dia, rugas nas nossas vozes. E você sempre falou aos montes. Sempre rasgando o silêncio, que não te pertencia. E eu gostava tanto e tanto. Gostava ainda mais quando finalmente silenciava e me olhava, compassando meu futuro com os olhos.
Parece que você não cicatriza nunca, Helena.

Eu vivo com esse receio do seu perfume voltar pros lugares de antes. Convivo com a vontade fixa de ver pelo menos mais uma vez o teu vestido caído no assoalho do quarto, numa daquelas tardes de verão.

Ah, Helena, eu queria. E quero.

Olha, mesmo você estando a sete palmos do chão, ainda te considero minha. E ainda te acho bonita. Bem bonita. Tão bonita que eu compraria um bilhete de trem e acenaria até o fim da plataforma, até o fim de mim, só pra te ver ali, Helena, no aguardo, se corroendo com a injustiça de estarmos separados.
Uma vida inteira nos separa. Um resto dela, na verdade.
Tudo perdeu a graça sem os teus corinhos pela casa, meu amor. Nada tem cor após o teu monossilábico adeus. Os cinemas parecem cheios demais, os cantos dos pássaros ficaram repetitivos e todas as mulheres perderam as curvas.

É tempo de esperar, afinal. Juntar os dias que me faltam e aguardar a minha partida. Por você tenho acreditado que há algo além da vida, do céu, do espaço, ou do raio que o parta. Tenho me iludido com isso só para ter a certeza de que vou ter a chance de me eternizar ao teu lado, Helena.

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